Muita
gente me pergunta como eu me posiciono em relação à Copa do Mundo e aos
protestos que giram em torno do evento no Brasil. Estou um pouco cansado de
ficar construindo argumentos e ao mesmo tempo preciso por pra fora o que penso
sobre tudo isso. Penso que um post será a melhor forma de fazê-lo.
Em primeiro lugar eu me
posiciono como alguém que acha legítima todas as expressões e fenômenos da
sociedade (julgue como fenomenologia ou como você quiser, este não é um artigo
acadêmico). Em segundo lugar, penso que o dinheiro (público e da família) que
foi investido em minha educação dentro das Humanidades foi muito alto e de
alguma forma eu preciso devolver todo esse investimento diferindo meu discurso
ao do senso comum. Quero apresentar alternativas de pensamento, diferentes
daquelas que já estão postas, seja pela mídia, seja pelos movimentos sociais. Vou explicar.
Pessoalmente, me envolvi muito
com os protestos de 2013. Aprendi muito na rua e vejo tudo com um balanço muito
positivo. Acredito que o país amadureceu
muito politicamente depois daquele ano. Somos outros. Até aquela época me
agradava a ideia de o Brasil sediar um megaevento como a Copa do Mundo FIFA.
Eu, como muitos brasileiros, comprei a ideia de que a Copa traria muitos
investimentos e seria a copa do povo brasileiro. Com todas as minhas forças eu
acreditei. Foi então quando, a apenas um ano do início dos jogos, eu percebi
que as obras estavam atrasadíssimas e novamente me vi enganado pela máquina
burocrática que é esse país (sem síndrome de vira-lata, por favor). Me indignei.
Me senti feito de trouxa. Mas ainda assim, minha vida de universitário de
classe média me era bastante agradável. Somente quando participei de uma
palestra do COPAC (Comitê Popular dos Atingidos pela Copa) que seria útil na minha pesquisa de TCC e ouvi o sofrimento
daqueles que foram diretamente atingidos pela FIFA, que me impulsionei a
denunciar os abusos dessa instituição.
Fizemos muito barulho ano
passado, como todos vocês já sabem e ganhamos a mídia internacional. Mas em
2014 optei por me afastar das ruas. Tenho trabalhado e estudado muito e não
saberia me envolver menos do que me envolvi ano passado. Também não tenho mais
estrutura psicológica para aguentar pressão policial, política, de amigos, família
e colegas. Eu fui até onde pude. Você pode até me achar um covarde, não me
importo. Meu sentimento é legítimo.
Uma vez que me afastei das ruas,
decidi acompanhar a Copa do Mundo. Não como torcedor canarinho, mas pela
importância do momento político, antropológico e econômico que estamos vivendo
e o evento representa. Tomada essa decisão me prometi jamais deslegitimar a
ação de manifestantes ou a vontade das pessoas em torcer pela seleção. Quero
compreender o que leva as pessoas a quebrarem bancos, carros da polícia e no
caso de ontem, a frente da Biblioteca Pública e o Cine Belas Artes, em BH,
assim como quero compreender o que leva as pessoas a esse amor incondicional
pela camisa verde e amarela.
Então vamos falar de Black Bloc.
Como todo mundo já sabe, o Black Bloc não é um movimento que surgiu no Brasil e
a galera que promove quebradeira não é desorganizada. Têm um alvo muito
específico que são os grandes símbolos do capital. Daí eu me pergunto: “Me faz
bem ver esses estabelecimentos sendo destruídos? Eu me sinto em paz com esse
clima de guerrilha?” Respondo: “Não gente, eu não me sinto. Fico aflito. Tenho
medo”. Mas não deslegitimo. É uma expressão legítima de repúdio ao tanto que
somos explorados pelo sistema capitalista. Simplesmente não aceito somar coro a
simplificação midiática no termo “vândalos mascarados”. São muito mais do que
simplesmente vândalos usando máscaras. Eles deixam uma mensagem sim, quer você
goste dessa mensagem, quer você não goste. (Mas aí já é outra discussão). Em
relação à Biblioteca e ao Belas Artes, senti muita raiva quando descobri que
foram depredados. Depois veio a reflexão: “são espaços de cultura e
conhecimento? São. Mas é possível entrar em um desses espaços trajado de forma que
não seja aquela típica da classe média? -a qual pertenço mas reconheço ser
segregadora.” Apenas notem como nós tratamos as pessoas “mal vestidas” nesses
espaços. Depois eu pergunto: “são espaços públicos para todas as pessoas? Não,
não são.” Daí eu encontro uma resposta para o ataque a esses espaços, mesmo que
pessoalmente, eu não queira que eles sejam destruídos. Lembro também das
famílias afetadas pela FIFA. Suas casas também foram destruídas, mas... Quem se
importa? Mês que vem esses espaços, assim como os bancos estarão restaurados como se nada tivesse acontecido. E as casas dessas pessoas?
Em relação ao olhar estrangeiro
sobre nós, só fica alarmado quem não lê os jornais de fora. Eles estão todos
abordando o que está acontecendo aqui, mas em momento nenhum eu leio coisas do
tipo “o Brasil é uma bagunça, corram de lá”. Europeus estão mais do que
acostumados com protestos violentos. Aquele continente foi erguido sobre sangue
de inocentes e vilões. Basta estudar um pouco de História pra saber disso.
Olhando sob a perspectiva da
diversão, gosto de ver a abertura (apesar de ter sido chinfrim- mas olha que
abertura de Copa do Mundo nunca é espetacular, isso é coisa de Olimpíadas),
gosto de falar mal de “We are one” e puxar saco da Shakira. Gosto de falar que
casaria com toda a seleção da Itália. Quero encontrar os gringos na Savassi.
Pra seleção não ligo. Futebol pra mim é Cruzeiro Esporte Clube (mesmo assim não
é sempre que acompanho os campeonatos estadual, brasileiro e libertadores).
Ao terminar esse texto, você
pode me achar um tremendo de um hipócrita, em cima do muro, lero lero, por
apoiar protestos mas não participar ou por ter perdido meu tesão pela Copa mas
ainda assim acompanha-la. Não preciso de aceitação pública, na verdade eu prefiro
essa fluidez que me permite analisar diferentes discursos, viver diferentes
realidades e construir diferentes posicionamentos ao longo da vida. Eu quebro,
eu conserto. Eu amarro, eu desamarro. Eu rabisco, eu apago. Se você quer torcer
pela seleção, torça. Se você quer protestar, proteste. Se você quer ficar
alheio, fique. É tudo da lei.