quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Oração para Jean

Deus, não sei como me dirigir a ti mas creio que o senhor me compreende. Não sei se devo tratá-lo no singular ou plural, feminino ou masculino, mas sei que tu não te importas com isso. Sendo assim tratar-te-ei da forma como meus pais me ensinaram: Deus. Masculino e singular.

Eu oro a ti pois todas as armas da racionalidade já não são suficientes em me fazer forte. Fui tão brutalmente atingido que somente a fé pode me libertar de tamanha angústia.

Não sei senhor, se estás a provar minha fé ou se possuo tamanha dívida com o universo que mereça passar por tal sofrimento. Mas peço, Deus, com tua infinita misericórdia, compadece-te de mim. Livra-me e protege-me daqueles que buscam fazer-me mal.

Devolve Pai misericordioso, minha alegria de viver, o sorriso de meu rosto e o amor pelas ruas da cidade. Tu sabes como sempre fui encantado pela urbes e hoje me vejo tomado por completa fobia das ruas.

Vê Senhor, o sofrimento de teu filho e cura-o desse trauma que o pegou despreparado e permita-o se esquecer do rosto daquele que o tirou a paz para que não o contemple todas as vezes que fecha os olhos e tenta dormir.

Eu sei que não devo me entregar ao medo e à depressão. Por isso te peço forças para passar por essa provação e sair vitorioso.

Perdão, Deus. Por todo o rancor e sentimentos negativos que tenham passado pelo meu coração. Quero chegar ao fim dessa prova mais humano e mais forte, pois estou certo de que minha jornada não termina aqui.

Ouve meu clamor senhor, e me perdoe por sequer saber fazer uma oração direito, mas a faço de coração.

Amém.

sábado, 19 de julho de 2014

Adeus aos que se foram

"São só dois lados da mesma viagem. O trem que chega é o mesmo trem da partida;" (Fernando Brant & Milton Nascimento)

Certa vez me peguei refletindo sobre aquelas pessoas que passaram por nossas vidas, deixaram uma forte marca, mas que por algum motivo se foram. Não é minha intenção encontrar culpados ou cobrar posicionamentos. Apenas quero externalizar a angústia que isso representa pra mim, familiar e nostálgico que sou.

Quando criança, em meu acalentador microcosmos, pensava que todos fossem eternos. Não havia aprendido a dizer "adeus". As pessoas com quem vivia voltavam para casa ao cair da noite. Aos fins de semana visitava meus parentes, que na verdade eram também meus vizinhos, sabendo que no sábado seguinte estariam lá novamente. De fato, toda a vizinhança se conhecia. Os encontros na rua, típicos dos bairros de periferia, fomentavam amizades, inimizades, convivência. Meus colegas de escola me acompanharam desde o jardim até a oitava série. Deixamos de ser crianças e entramos na puberdade juntos. Quanta vivência construímos e compartilhamos!

Mas o fato é que quando a gente cresce percebe que a vida é feita de encontros e desencontros. Aqueles que seriam eternos talvez não estejam mais lá, ou quem sabe, tenham se tornado secundários. Enfim aprendemos que um "até mais" pode não se concretizar. Hoje aprendi a superar as despedidas e viver sem aqueles que foram importantes para mim. Prossigo meu caminho, ganho o mundo, mas não posso negar que em meu coração existe uma brecha deixada por vocês. Tenho saudades do meu pai, do quarto com o cheiro da minha irmã. Tenho saudades do clubinho do Francisca Malheiros, da queimada na rua. Tenho saudades da vizinhança que deixei. Tenho saudades dos lugares por onde passei, das pessoas que conheci.

Isso é pelo Tupí; Isso é pelo Francisca Malheiros; Isso é por meu pai; Isso é pelo Tio Miguel; Sol; Bruna; Luan; Jéssica; Alice; Larissa; Juliana; Tia Verlaine; Paula; Flávia; Vinícius; Thales;

sexta-feira, 13 de junho de 2014

(#Não) #Vai ter Copa. (#Não) #Está tendo Copa. (#Não) #Teve Copa.

Muita gente me pergunta como eu me posiciono em relação à Copa do Mundo e aos protestos que giram em torno do evento no Brasil. Estou um pouco cansado de ficar construindo argumentos e ao mesmo tempo preciso por pra fora o que penso sobre tudo isso. Penso que um post será a melhor forma de fazê-lo.

Em primeiro lugar eu me posiciono como alguém que acha legítima todas as expressões e fenômenos da sociedade (julgue como fenomenologia ou como você quiser, este não é um artigo acadêmico). Em segundo lugar, penso que o dinheiro (público e da família) que foi investido em minha educação dentro das Humanidades foi muito alto e de alguma forma eu preciso devolver todo esse investimento diferindo meu discurso ao do senso comum. Quero apresentar alternativas de pensamento, diferentes daquelas que já estão postas, seja pela mídia, seja pelos movimentos sociais. Vou explicar.

Pessoalmente, me envolvi muito com os protestos de 2013. Aprendi muito na rua e vejo tudo com um balanço muito positivo.  Acredito que o país amadureceu muito politicamente depois daquele ano. Somos outros. Até aquela época me agradava a ideia de o Brasil sediar um megaevento como a Copa do Mundo FIFA. Eu, como muitos brasileiros, comprei a ideia de que a Copa traria muitos investimentos e seria a copa do povo brasileiro. Com todas as minhas forças eu acreditei. Foi então quando, a apenas um ano do início dos jogos, eu percebi que as obras estavam atrasadíssimas e novamente me vi enganado pela máquina burocrática que é esse país (sem síndrome de vira-lata, por favor). Me indignei. Me senti feito de trouxa. Mas ainda assim, minha vida de universitário de classe média me era bastante agradável. Somente quando participei de uma palestra do COPAC (Comitê Popular dos Atingidos pela Copa) que seria útil na minha pesquisa de TCC e ouvi o sofrimento daqueles que foram diretamente atingidos pela FIFA, que me impulsionei a denunciar os abusos dessa instituição.

Fizemos muito barulho ano passado, como todos vocês já sabem e ganhamos a mídia internacional. Mas em 2014 optei por me afastar das ruas. Tenho trabalhado e estudado muito e não saberia me envolver menos do que me envolvi ano passado. Também não tenho mais estrutura psicológica para aguentar pressão policial, política, de amigos, família e colegas. Eu fui até onde pude. Você pode até me achar um covarde, não me importo. Meu sentimento é legítimo.

Uma vez que me afastei das ruas, decidi acompanhar a Copa do Mundo. Não como torcedor canarinho, mas pela importância do momento político, antropológico e econômico que estamos vivendo e o evento representa. Tomada essa decisão me prometi jamais deslegitimar a ação de manifestantes ou a vontade das pessoas em torcer pela seleção. Quero compreender o que leva as pessoas a quebrarem bancos, carros da polícia e no caso de ontem, a frente da Biblioteca Pública e o Cine Belas Artes, em BH, assim como quero compreender o que leva as pessoas a esse amor incondicional pela camisa verde e amarela.

Então vamos falar de Black Bloc. Como todo mundo já sabe, o Black Bloc não é um movimento que surgiu no Brasil e a galera que promove quebradeira não é desorganizada. Têm um alvo muito específico que são os grandes símbolos do capital. Daí eu me pergunto: “Me faz bem ver esses estabelecimentos sendo destruídos? Eu me sinto em paz com esse clima de guerrilha?” Respondo: “Não gente, eu não me sinto. Fico aflito. Tenho medo”. Mas não deslegitimo. É uma expressão legítima de repúdio ao tanto que somos explorados pelo sistema capitalista. Simplesmente não aceito somar coro a simplificação midiática no termo “vândalos mascarados”. São muito mais do que simplesmente vândalos usando máscaras. Eles deixam uma mensagem sim, quer você goste dessa mensagem, quer você não goste. (Mas aí já é outra discussão). Em relação à Biblioteca e ao Belas Artes, senti muita raiva quando descobri que foram depredados. Depois veio a reflexão: “são espaços de cultura e conhecimento? São. Mas é possível entrar em um desses espaços trajado de forma que não seja aquela típica da classe média? -a qual pertenço mas reconheço ser segregadora.” Apenas notem como nós tratamos as pessoas “mal vestidas” nesses espaços. Depois eu pergunto: “são espaços públicos para todas as pessoas? Não, não são.” Daí eu encontro uma resposta para o ataque a esses espaços, mesmo que pessoalmente, eu não queira que eles sejam destruídos. Lembro também das famílias afetadas pela FIFA. Suas casas também foram destruídas, mas... Quem se importa? Mês que vem esses espaços, assim como os bancos estarão restaurados como se nada tivesse acontecido. E as casas dessas pessoas?

Em relação ao olhar estrangeiro sobre nós, só fica alarmado quem não lê os jornais de fora. Eles estão todos abordando o que está acontecendo aqui, mas em momento nenhum eu leio coisas do tipo “o Brasil é uma bagunça, corram de lá”. Europeus estão mais do que acostumados com protestos violentos. Aquele continente foi erguido sobre sangue de inocentes e vilões. Basta estudar um pouco de História pra saber disso.

Olhando sob a perspectiva da diversão, gosto de ver a abertura (apesar de ter sido chinfrim- mas olha que abertura de Copa do Mundo nunca é espetacular, isso é coisa de Olimpíadas), gosto de falar mal de “We are one” e puxar saco da Shakira. Gosto de falar que casaria com toda a seleção da Itália. Quero encontrar os gringos na Savassi. Pra seleção não ligo. Futebol pra mim é Cruzeiro Esporte Clube (mesmo assim não é sempre que acompanho os campeonatos estadual, brasileiro e libertadores).


Ao terminar esse texto, você pode me achar um tremendo de um hipócrita, em cima do muro, lero lero, por apoiar protestos mas não participar ou por ter perdido meu tesão pela Copa mas ainda assim acompanha-la. Não preciso de aceitação pública, na verdade eu prefiro essa fluidez que me permite analisar diferentes discursos, viver diferentes realidades e construir diferentes posicionamentos ao longo da vida. Eu quebro, eu conserto. Eu amarro, eu desamarro. Eu rabisco, eu apago. Se você quer torcer pela seleção, torça. Se você quer protestar, proteste. Se você quer ficar alheio, fique. É tudo da lei.