terça-feira, 29 de março de 2016

O porquê de eu criticar tanto os movimentos sociais

Depois de muito pensar se valeria a pena escrever sobre esse assunto, me sinto confortável para expor como me sinto frente aos movimentos sociais da atualidade. Aqueles que me conhecem, sabem como já me envolvi bastante com movimentos sociais, principalmente durante e após os protestos de 2013, e hoje passo a maior parte do tempo os criticando. Resolvi explicar o motivo, ainda que ninguém leia (hue).

Farei um pequeno relato pessoal nesse parágrafo. Em outubro e novembro de 2014, dois eventos mudaram por completo a forma como eu enxergo o mundo: eu sofri dois assaltos, nos quais fui agredido no primeiro e feito refém por alguns minutos no segundo. A consequência foi o desenvolvimento de um TEPT (Transtorno de estresse pós-traumático) que me levou a tratamento com psicóloga e médico e uso de antidepressivo e ansiolítico. No início da doença, minha vida se tornou um inferno, com crises de pânico na rua, sintomas de depressão (não conseguia mais ir à acadêmia, faltava às aulas, não queria fazer nada quando chegava em casa...) e consequente afastamento de amigos por não conseguir sair à noite e chegar sozinho em casa. Só saía de dia ou se pudesse dormir na casa de alguém.

Esse evento aconteceu no auge do meu envolvimento com os movimentos sociais e obviamente, busquei neles respostas ao que se passava comigo. Também clamei por ajuda de vários amigos militantes para conseguir lidar com aquele momento difícil. De alguns, recebi ombro amigo (aos quais muito agradeço), de tantos outros, apatia e por vezes insinuações de que eu não deveria sofrer pois eu sou branco e a violência urbana é culpa das desigualdades provocadas por meus antepassados. Naquela época, surgiram notícias de um ônibus em BH em que os assaltantes só roubavam pessoas brancas, pois eles "não roubavam trabalhadores" (como se pessoas brancas em um ônibus também não o fossem). Boa parte dos militantes negros do meu FB começaram a compartilhar essa notícia em tom de comemoração, dizendo que aquilo era justiça social! Foi naquele momento que eu comecei a perceber que algo nos movimentos sociais estava muito errado. Naquela época, os movimentos ainda eram um pouco abertos a diálogo (com exceção das radfem) entre todos os que estivessem interessados em contribuir. Era algo, na minha opinião, que agregava mais discussões saudáveis do que falaciosas. 

Decidi então, no início de 2015, passar a observar os movimentos sociais mais do que comentar, compartilhar, me reunir e ir às ruas. Até porque eu estava no auge dos efeitos do TEPT e apenas com ajuda de terapia com a psicóloga.  A partir daquela época, só vi as coisas irem de mal a pior. Começaram a ganhar força as discussões sobre apropriação cultural, lugar de fala, misandria e heterofobia* (back in 2013, misandria e heterofobia eram termos que não passava pela minha cabeça que iriam se concretizar). Eu até acredito que apropriação cultural e lugar de fala tenham um fundamento interessante e legítimo. Mas os movimentos sociais decidiram levar essas discussões para o pior caminho, impedindo pessoas brancas de usarem turbantes ou falarem sobre racismo, por exemplo, o que é bastante arbitrário. Os gays estão sendo "expulsos" do movimento LGBT (hoje em dia é comum você ver pessoas falando em movimento LgBT ou movimento LBT, ou ainda movimento LBTXYWZ), e a principal ferramenta de luta de vários coletivos é competir para ver qual letra é a mais oprimida. Vejo pessoas forjando provas para legitimar sua existência enquanto grupo (como em um caso de uma americana negra que fez uma pichação racista no banheiro de sua escola e depois fotografou dizendo que era necessário lutar contra a sociedade racista. Por sorte outra aluna a viu fazendo essa pichação e denunciou o forjamento de provas). Este é apenas um dos vários casos. São várias atitudes tóxicas e "tiros nos pés" que me impedem a cada dia mais de tomar parte nesses coletivos. Não vejo sentido em nada nisso.

Eu sou uma pessoa que não acredita que autoritarismo e exaltação em debates políticos (de qualquer natureza) sejam medidas aceitáveis. Em qualquer debate, eu prezo pela educação e respeito às ideias do debatedor do outro lado, ainda que completamente discordantes da minha moral. Eu sou um ferrenho defensor da Liberdade de Expressão em seu mais amplo sentido. Para mim, ideias imorais e antiéticas, são combatidas no campo das ideias e da retórica, não pelo silenciamento.

Hoje, eu cheguei a um estágio em que prefiro lutar contra as falácias dos movimentos sociais e, acredito que isso seja sim, militar. Certa vez um amigo na minha TL mandou uma indireta do bem perguntando qual o motivo de lutar contra os SJW (Social Justice Warriors) sendo que há tantos casos de violência contra minorias no país. Foi inclusive esse o post motivador a escrever esse texto (eu agradeço pela provocação). Aí vai minha resposta: Eu luto contra a homofobia (visto que sou gay) cotidianamente. Ando de mãos dadas na rua com meu namorado, sirvo de exemplo nos meus espaços (trabalho, família...), dialogo com pessoas que fazem comentários desagradáveis a nosso respeito. Luto também contra racismo e machismo, quando algum parente ou conhecido fala ou faz algo inapropriado. Contudo, nas minhas redes sociais, os posts contra preconceitos não surtem mais efeito nenhum. Recebem uma chuva de curtidas de pessoas que já são contra preconceitos. Contudo, eu sei que meus posts com críticas aos movimentos sociais surtem efeito (ainda que de antipatia), pois apontam os calos nos pés de todos nós que decidimos militar por um mundo melhor para todos. Eu sei que nós estamos acostumados a ver pessoas que querem manter o status quo criticando os movimentos sociais com argumentos que já cansamos de rebater. Mas agora surgem pessoas solidárias às causas que também têm críticas de sobra a serem feitas. Portanto amigos, não nos vejam como pessoas que odeiam as minorias, mas sim, que querem lutar por um mundo melhor sem usar de ativismo falacioso e desonesto.

P.S. Quando eu falo em movimento sociais, eu sei que existem centenas de linhas e coletivos e que não necessariamente todos se enquadram nas descrições que fiz. Meu texto generaliza pois acredito que a premissa atual seja essa que descrevo, baseado nas páginas mais populares e com mais curtidas e compartilhamentos no FB (Cartazes e Tirinhas LGBT, Feminismo sem Demagogia, os posts da Absoluta, etc..) e no que é postado e comentado em grupos (como os da Jout Jout).

* Vale uma nota aqui. Eu não acredito que exista misandria e heterofobia institucionais e componentes majoritários da sociedade. Mas acredito que sim, existam nos microespaços de vários movimentos sociais, com pessoas que abertamente decidiram ser misândricas e heterofóbicas. Estou mentindo?

Texto revisado por cordialidade da Carol Oliveira. =)

domingo, 17 de janeiro de 2016

Moral

Tenho percebido que a medida em que envelheço, mais descubro quem sou. Em um ato de amor próprio, alguns diriam até narcisista, me delicio ao descobrir minhas capacidades emocionais. De fato, ser adulto implica pensar diferente de quando se era criança. Aqueles sentimentos que me atormentavam, o medo, a insegurança, a covardia... Tudo isso passou a ser visto sob uma nova perspectiva. Não tenho mais medo de ficar sozinho. Tenho medo de não poder ser quem sou; Não me sinto inseguro diante de uma prova ou ambiente novo. Me sinto seguro para trilhar meus caminhos, mesmo sabendo que ainda tomarei estradas erradas até que encontre meu objetivo; Não me acovardo mais diante daquilo que me tira o conforto emocional. Resolvo sem botar panos quentes, ao menos quando me dão liberdade para tal.

E é no cotidiano, ao lidar com tantos outros adultos,ao lidar com questões familiares e profissionais sem ser visto como alguém que deve ser protegido pela menoridade, percebo que lido com seres humanos que passaram pelo mesmo que eu, de maneiras diferentes. As qualidades desenvolvidas por cada um são diferentes das minhas e eu perfeitamente entendo que ninguém é melhor ou pior por isso. Apenas diferentes. 

Certa vez, alguém me disse que meu caráter é duvidoso. Após muito refletir, e usar este comentário para meu crescimento pessoal, consertando aqueles pontos em que de fato ela estava certa, começo a perceber que pessoas diferentes vivem de morais diferentes. O que é um erro grave para um, não é para o outro. Mas, afinal, isso é o que torna o mundo belo e diverso. A chave, então, para a boa convivência, entre pessoas com morais diferentes que precisam conviver, se chama respeito mútuo.

Isto é tudo o que quero. Isto é o que estou disposto a dar. Não acho minha moral superior às outras e abomino quem pensa assim. Vida que segue, ainda que com uma estranha sensação de que nem todo conflito terá solução.