domingo, 14 de março de 2021

I’m done

"I'm done". Essa é a expressão que traduz tudo o que senti nesses último meses. 2014 foi um ano do qual jamais me esquecerei, se houve um momento em que minhas crenças foram provadas, este foi o momento. Posso dizer que me sinto forte e adulto como nunca me senti antes, mas para isso tive que passar por uma batalha com meus próprios valores.

Sempre fui muito intenso no que cri. Tive minha fase de evangélico, de ateísta, naturalista, vegetariano, aquecimentista, militante de esquerda, entre outras. Sempre vivi em busca daquilo que acreditei ser o "certo", o "correto" e para afirmar meus valores como verdadeiros, sempre precisei mostrar como o oposto era "errado". Talvez essa necessidade de deslegitimar o diferente, mostre quão frágeis minhas convicções sempre foram.

Acontece que, entre verdades aqui e ali, de repente percebi que elas não pode ser absolutas. Nada do que acredito jamais uma máxima. Sempre haverão outras verdades e este é o ponto que nos tira da adolescência e nos faz realmente adultos: altruísmo, empatia e respeito às diferenças. Quando eu digo "ser adulto", de forma alguma me refiro à idade, mas sim ao acúmulo de experiências vividas ao longo da vida que nos fazem refletir sobre quem somos e aonde devemos chegar. E isso, inevitavelmente vem com o tempo, com a vivência. Para uns cedo, para outros tarde, para outros nunca.

Eu acredito que esse sentimento tenha começado com as Eleições presidenciais de 2014. Eu parei de defender meus posicionamentos e comecei a ouvir, a tentar compreender todos os discursos e foi isso que aconteceu. Eu compreendi que as pessoas podem ter um bom coração votando em Aécio ou Dilma. Não são apenas os que votam no partido de extrema esquerda que estão bem intencionados como em minha antiga arrogância costumava crer. Dividir as pessoas em dois grupos como foi feito é simplificar e emburrecer a análise da sociedade.

Em seguida fui confrontado com três assaltos nos meses de outubro e novembro, no qual em dois dele sofri de uma violência injustificável. Além de apanhar fisicamente em plena luz do dia, fui feito refém por alguns minutos e sofri uma violação psicológica sem precedentes na minha vida. Vivi o inferno em que tudo o que conseguia era ficar em casa chorando e apavorado, com medo. Até hoje, tenho pesadelos todos os dias quando durmo com violência urbana. Muitas pessoas sofrem da violência urbana, de diferentes formas, seja na favela, seja no asfalto, seja qual for a posição social. Alguns inclusive sofrem muito mais do que eu. Nunca me esquecerei dos relatos de moradores da favela a respeito da violência policial, por exemplo. Eu não sofro disso e devo ter consciência de que outras pessoas sim. Desta forma, em momento algum posso dizer que o sofrimento no meio urbano seja uma questão presente apenas entre os que pertencem ao mesmo extrato social que o meu. Mas esse fato só veio de encontro com minhas crenças a partir do momento em que algumas pessoas disseram que por eu ser uma pessoa branca de classe média deveria "relativizar" a situação, como se minhas características me fizessem merecedor de tamanho sofrimento. Eu senti raiva, me senti frustrado. Não acho justo um discurso que ignore o sofrimento de uma pessoa e infelizmente ele é cada vez mais comum na militância. Eu estou farto de militância que só consegue pensar por estruturas. Ninguém escolhe nascer como nasce. As estruturas estão postas muito antes de nós nascermos e não é hostilizando pessoas favorecidas que vamos mudar essa situação, pelo contrário. Eu desejo o fim da heteronormatividade, por exemplo, mas de forma alguma desejo sofrimento para pessoas heterossexuais. Nossos inimigos não são pessoas e esse isolamento do mundo só nos faz acirrar as diferenças. Não é dessa forma que resolvemos os problemas. A militância se tornou algo tão mesquinho, é cheia de facções, o que a torna cega. Não permite que seus adeptos questionem, ou proponham algo diferente. Ela está tão enrijecida que me lembra em muito as instituições religiosas.

Posto esse texto nesse blog em que quase ninguém lê, pois, assim como estou farto de tentar alertar fiéis da igreja, não mais tentarei alertar militantes de esquerda. Quem quiser seguir em suas convicções enrijecidas, que sigam! Eu posso conviver com você, eu sei aceitar que existem pessoas que pensam diferente de mim e nem por isso precisam se tornar minhas inimigas. Nem por isso preciso printar a cara delas e expô-las ao ridículo nas redes sociais e assediá-las por pensarem diferente.

Sigo minha fé independente de qualquer instituição religiosa, sigo minha militância independente de qualquer instituição de esquerda. Estou feliz assim e os deixo em paz para agirem da forma como for melhor para vocês e continuarmos nos respeitando.
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Eu escrevi esse texto em 2015. Encontrei perdido aqui nos rascunhos. 

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